Poesias

quarta-feira, 6 de abril de 2011

A terra e o homem

Ainda ontem eu podia ouvir
a canção de um pássaro hoje extinto.
A vibração desse canto enchia o céu
de beleza, de esperança, de poesia.
Era um pássaro verde e havia azul
em cada olho, em cada asa, em cada vôo.
Ainda ontem eu fechei os olhos
e nunca mais o ouvi cantar.

Nasci da terra e o seu ventre
protegeu-me durante a fecundação.
Criei raízes, julguei-me melhor amado.
No seu leite, deleitei-me quando criança.
Hoje forte o bastante pra lutar,
ainda ouço a canção do pássaro morto
e o meu coração com uma folha
balouça à brisa e a ele chora.

O que somos nós, senão parte da vida?
E ela toda encerra a humanidade.
Quem somos nós que buscamos, que perdemos?
Que mal sabemos onde estamos?
Somos talvez herança dos malditos
e onde estamos é lugar nenhum.
O que queremos, nós não temos brios,
nem forças para o subsistir?

Quando me sinto assim perco o sentido
e o meu corpo procura a natureza.
Torno-me animal, me faço planta.
O meu sonho existe, eu nele, não.
Torno-me parte da terra toco-a aflito
e penso ser o começo do bem.
Pois nela há bondade no ventre.
É onde dormem os bons, o sono justo.

Em mim palpitam corações extintos
dos animais covardemente mortos.
Batem como se vivos ainda fossem;
como se procurasse em mim a vida.
Os seus urros, seus gorjeios, os gritos
enchem a floresta de sons fantasmas.
Estão em toda parte e são o nada
que envolvem as noites vazias da terra.


Perdi-me entre cachoeiras e lagos
calmos com os sons do vento.
Entrei nas colméias e reverenciei suas rainhas.
Tão precioso mel! As rosas, as flores
tocaram minhas mãos aromatizando-as.
Na chuva lavei minha alma, toda ela:
Pecaminosa, frustrada, complexa e insegura.
Senti-me envolvido, mas sem nexo algum.

Todos os caminhos levam a mim
e neles eu escolho a caminhada.
Que passo darei e a aonde fica
o norte, o sul, o oeste e o som.
O som que também é um destino
e alcançá-lo é saber a melodia de cor e
que noite se contagia com a vida.

Descobri-me vagando pela terra
e os caminhos que fiz e os rastros
Levou-me a lugar algum e ao medo
de me perder novamente, no vazio jogado.
Vi-me de frente num espelho de água
e já não era o mesmo do início.
Eu sou da terra e pertencendo ao pó
a ele volverei quem sabe um dia.

O som da canção de um pássaro morto
aquece-me o coração, calma me envolve.
E como uma criança eu adormeço
e acordo.
E há rios silêncioos nas palavras não ditas.

Marianne Lee

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